Perspectivas e importância da investigação sobre o uso de medicamentos no cenário brasileiro
Abstract
A observação e monitoramento de informações relacionadas à segurança dos medicamentos
viabilizam o compartilhamento das práticas e das culturas dominantes sobre o seu uso, podendo fornecer
subsídios à avaliação e formulação de políticas regulatórias, bem como ao delineamento de estratégias
para a abordagem de problemas locais1
. Os serviços de farmácia configuram-se como setores-chave para
o registro e a consolidação de informações relacionadas à assistência farmacêutica. Sua responsabilidade
em promover e esclarecer questões relacionadas ao uso de medicamentos no Brasil foi apontada há mais
de duas décadas por Castilho2
.
Ainda incipiente, a produção de conhecimento bem como a implementação de ações no campo da
farmacoepidemiologia vem aumentando, possivelmente, como um reflexo da mudança nas diretrizes
curriculares do farmacêutico. A reorientação da atuação do profissional, ao deixar de ser centrada no
medicamento, incluiu o desenvolvimento de competências relacionadas ao cuidado em saúde dos
usuários e da comunidade, abarcando a discussão de metodologias para realização de estudos de utilização
de medicamentos.
Prontuários, fichas clínicas, bancos institucionais locais e questionários específicos são as fontes de
informação frequentemente utilizadas em estudos brasileiros3,4. Por outro lado, grandes bases de dados
secundários —bancos informatizados que armazenam registros nacionais ou mundiais — têm sido
largamente empregadas nos EUA, Canadá, Austrália e em diversos países da Europa3
. Denominados
Big Data, estes sistemas permitem acesso a um considerável volume de informações em curto espaço de
tempo e sem custos adicionais para o sistema5
.
O Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) foi o primeiro criado oficialmente no Brasil, com
a publicação da Lei 6.229 em 1975. Atualmente, outros sistemas são disponibilizados pelo Departamento
de Informática do SUS como o Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC), o Sistema de
Informação de Agravos de Notificação (SINAN) e o Sistema de Informações Hospitalares (SIH-SUS)6
,
com destaque para o último que representa a principal fonte de dados administrativos em saúde, de base
hospitalar e com abrangência nacional. Uma das vantagens do SIH/SUS é o fornecimento de informação
diagnóstica, demográfica e geográfica para cada internação hospitalar7
. Entretanto, o resgate dos dados
sobre o conjunto de medicamentos — disponíveis na descrição dos procedimentos no SIH/SUS — exige
um longo processo de extração, com diversos cruzamentos de arquivos5
. Este aspecto exemplifica uma das
dificuldades para seu uso.
Outros sistemas merecem destaque pela especificidade, como o Sistema Logístico de Medicamentos (SICLOM), o Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados (SNGPC) e, no âmbito da
farmacovigilância, o Sistema de Notificações em Vigilância Sanitária (NOTIVISA) e o Sistema Nacional
de Informações Tóxico-Farmacológicas (SINITOX). O Sistema Hórus de gerenciamento da assistência
farmacêutica, em processo de implantação, também apresenta potencial de incorporação das variáveis
relativas ao perfil de utilização dos medicamentos.
Infelizmente, os registros sobre os medicamentos envolvidos em agravos à saúde nas bases de
dados, principalmente em relação à segurança do seu uso, ainda são fragmentados3
. O Brasil carece
de interoperabilidade entre os sistemas de informação e há pouco conhecimento sobre a aplicação
dos mesmos para outros escopos, uma vez que a maior parte foi delineada para fins administrativos3,8. Além disso, a qualidade destas bases, considerando as dimensões de cobertura, clareza metodológica,
completitude, confiabilidade e consistência9
precisa ser verificada.
Este cenário indica que há muito a ser feito. Não obstante, a exploração destes sistemas é imprescindível
para aumentar o conhecimento sobre os aspectos epidemiológicos e econômicos do uso de medicamentos
no Brasil. Um caminho para este garimpo seria a ampliação de parcerias entre serviços de saúde,
universidades, centros de pesquisa e instâncias governamentais brasileiras para discussão, qualificação de
profissionais, recrutamento e formação de pesquisadores no campo.
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